Só a cruz não é suficiente

por Zé Luís

Numa sexta-feira histórica, homens – ditos – santos coçam as barbas, vitoriosos, diante do Deus moribundo, que pende em um madeiro, vertido em sangue. Ali sorriem diante do desafeto: quem aquele jovem de Nazareth pensava ser quando provocou a ira dos religiosos, a influente liderança daquele povo?

Agora, assistiam o agonizante show proporcionado pelos romanos às vésperas do sábado sagrado: entre ladrões condenados, um inocente insistia em continuar a ser violentado sem soltar o menor dos palavrões, um insulto que revidasse, uma maldição que desabafasse tanta injustiça cometida contra o único homem sem pecado que se soube desde a eternidade

Sacerdotes de Deus divertiam-se tentando interpretar o que o jovem moço balbuciava:

“Eli, Eli, Lama Sabactani?” - “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” virou um comentário irônico de um deles:
“Chama por Elias (popular profeta do Antigo testamento)?”
“Deixe-o... vamos ver se o profeta aparece para salvá-lo...”
“Não é o rei? Saia da cruz!”

A troça lembra papo de botequim, entre fariseus que se assentam à mesa enquanto esperam o derradeiro fim do odiado moço, enquanto bebericam em meio a gemidos de dor e lamentos de familiares que choram a inevitável morte.

“Abba... perdoa eles... não sabem o que fazem...” dizia, mesmo empapuçado em dor, mesmo com o escárnio dos homens maus que se diziam santos, e dos soldados que cumpriam seu cotidiano de matança enquanto, aos pés da cruz, sorteavam com quem ficaria os pertences do condenado, diante da família, diante de todos.

Ah... se soubessem que essa cena, entre milhares de milhares de atrocidades cometidas, ficaria documentada pelos séculos dos séculos... se imaginassem que ali Deus cumpria seu propósito, e exporia aos homens o quão cruéis são, que seriam contados pela eternidade sem poupar credenciais, cargos e motivos. Que aqueles que praticaram o mal seriam lembrados para todo o sempre como o que eram, e não pelas máscaras que portavam.

Na cruz, uma criança inocente clamava por seu papai, no qual em momento algum esteve ausente... até aquele momento: O grande desespero da cruz não foram as dores intermináveis que só terminariam com o fim da vida do que ali estava, o tétano se espalhar por seu corpo enrijecendo todos os músculos, o coração sufocar pela extenuante posição que foi pregado.

Para Ele, o desespero maior estava em descobrir como era estar separado, pela primeira vez, do Pai amado. Toda a Ira Dele, que nos pertencia, foi lançada sobre Ele mesmo, e assim, o coração, abarrotado de culpa pelo pecado – causa da separação, explodiu, gerando a água que vazou pela ponta da lança do soldado.

Quando o – imaginado – fim chegou, os homens maus se entreolharam, mas não estavam satisfeitos, algo dentro deles estava vazio, deserto, árido, desprovido de ódio. A terra treme, os mortos ressurgem, o véu do templo se rasga, e uma pergunta grita na mente diante de tamanho pecado:

“O que nós fizemos? Do que fomos capazes? Por que nossa natureza caída não consegue evitar que procuremos destruir o belo, o imaculado, o limpo, o honesto, o correto?”. Era apenas o fim da Vida acenando para eles a parte que lhes cabia naquele latifúndio.

E mesmo depois, mesmo muitos daqueles que se dizem ser Dele, cometerão atrocidades piores em seu Nome, com torturas e assassínios. São os mesmos que chegam até a cruz, mas só querem ver qual mágica o homem-Deus fará, negociar com o que supostamente Ele poderia ter dito, dividir o despojo que o cadáver deixará, divertir-se às custas do povo que lamenta a dor, embora seja o mesmo povo que o colocou lá...

A cruz ainda está lá, para todo aquele que quiser conhecê-la e saber como se aproximar dela, embora cada um tem seu motivo de procurá-la, e isso não fala sobre quem é crucificado, mas o motivo que o leva ao sacrifício.

Chegar a cruz não basta, se o motivo que te leva ao sangue do cordeiro não te lava.

Comentários

  1. Alguém me explica o coração explodir e depois sair água. Já vi um pastor aqui em S. Luis falar isso.

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  2. Mab,

    Tem um livro de um médico que descreve a crucificação de Jesus e explica o porquê da água.
    Veja neste link:
    http://jeffersonmagnocosta.blogspot.com.br/2011/01/ferida-no-coracao-de-jesus.html

    Abs,

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